segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Futebol não, meu filho. Vai tocar violão!

Matheus tem cinco anos de idade e, como qualquer criança, adora futebol. Mesmo antes de vir ao mundo, uma camisetinha do time de coração do pai já estava pendurada na porta do quarto da maternidade. Ela se soma aos bichinhos com uniforme do time que lhe foram dados de presente, mesmo antes de vir à luz.

Matheus foi crescendo, ganhou bolas de presente, um uniforme completo do time do paizão e sempre vestia a camisa quando completava mais um ano de idade. As fotos de todos os aniversários revelam essa paixão do pai que era passada ao filho.

Quando começou a balbuciar as primeiras palavras, depois de “papá” e “mãm”, o primeiro grito que soltou foi “gooooool”. Já se via que ia ser um torcedor fanático. Ainda engatinhava quando saiu de joelhos, louco atrás de uma bola. Quando deu os primeiros passos então, parece que tinha aprendido a chutar, antes mesmo de caminhar.

Matheus fez três anos e foi pra escola. Nos intervalos, não queria saber de outra coisa a não ser da bola que carregava sempre na mochila. Muitas vezes “pirraceava” quando a mãe o proibia de ir à escola com o uniforme do time. E não adiantava explicar que ele tinha de usar o uniforme da escola. E seus olhos brilhavam quando passava em frente aquela imensa construção com a inscrição “Estádio” e ouvia “Papai ainda vai te trazer aqui!”.

Matheus adorava aquele mundo chamado futebol, mas ainda não entendia direito o que era. Só ficava encantado, assistindo aos jogos pela televisão junto ao pai e depois saia correndo pra pegar a bola e fazer a mesma coisa que aqueles “homenzinhos” que estavam ali na tela.

O garoto foi crescendo e entendo um pouco mais das coisas. No último fim de semana, já aos cinco anos de idade, foi presenteado pelo seu pai com a primeira visita ao estádio. Afinal era a final do campeonato – um momento de festa, de confraternização. Mas quando terminou o jogo, o menino presenciou pela primeira vez uma violência que jamais vira até então. E, assustado, disparou ao pai:

- Quer dizer que depois de jogar bola a gente pode bater nos coleguinhas? Porque aquelas pessoas estão quebrando tudo? A gente pode fazer isso também? Pai, quando eu crescer você compra um porrete daqueles pra mim? Porque a polícia está jogando bombas neles? Nossa, quanto sangue na cara daquele ali! Pai, a gente pode jogar pedra na polícia também? Porque você me ensinou a gostar disso? Não era pra ser uma coisa legal?

O pai engolia cada pergunta e não conseguia soltar as respostas. Chegou em casa, pegou tudo que era do menino relacionado a futebol e queimou dentro de uma lata. No dia seguinte lhe trouxe um violão de presente e disse: “Meu filho, a partir de agora você vai ter outra paixão. E tudo que você quiser me perguntar sobre isso, eu vou saber te responder”.

Ao presenciar cenas como as desse fim de semana, sinto a mesma vergonha desse pai que representa milhões de pais brasileiros que tentam ensinar o melhor aos seus filhos. Fico pensando apenas de como será na Copa de 2014 e nas Olimpíadas de 2016. Se eu tiver mais um filho agora, tomara que as coisas tenham mudado até lá.

2 comentários

Ana Beatriz Camargo disse...

Bem, já é clichê eu chegar ao seu blog, ler mais um texto e comentar que está ótimo, perfeito, uma delícia de ler e tal e tal coisa... Então, vou passar a dizer que está como sempre! Como sempre ótimo, como sempre perfeito, como sempre uma delícia de ler e como sempre tal e tal coisa.

Eu só não entendi se essa é a história do seu filho e sua; se o Matheus é o seu filho...

Sei lá, mas o que mais me deixa "assustada" é como as nossas crianças estão crescendo, os sonhos que estão passando a ter, os conceitos que estão passando a adotar, as coisas que estão tendo que presenciar cada vez mais cedo. O difícil e triste será quando nem mais aquela cidade dos Saltimbancos for capaz de manter a ingenuidade e a paz das crianças - aquela cidade em que moradores, varredores, pintores e vendedores, senhoras e senhores, guardas e inspetores são somente crianças.

André Martins disse...

Ogg
Mais uma vez parabéns pelo artigo. Sensível pela analogia, e lamentável pelos fatos. O pior é ver que quem perdeu, brigou, e no Rio, quem ganhou também brigou. E vandalizou, destruiu o bem público, agrediu a polícia. Acho que a nossa Copa e a nossa Olimpíada não serão civilizadas, mas policiadas. Lamentável.
Abraço, irmão.

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